30 maio 2006

A namorada do Unabomber

Eles estavam sentados em algum café perdido do Kentucky. Ela, de tão viajada, chamava os namorados pelo estado. Missouri era babaca e sovina. Mas ela tinha treze anos. North Dakota bebia demais, e brochava. Ohio partiu. Ele que parta, ela pensou aos vinte um. Agora bebia um milk-shake com New Jersey. Eles acabaram de se conhecer. Ele disse que seu nome de verdade é Ted, mas ela duvida.
- O que você faz da vida?
- Sou carteiro.
- Da Fedex?
- Não, de Deus.
- Foi contratado por processo de seleção?
- É, seleção natural. Detonei na dinâmica de grupo.
- Ganhou de todos?
- É, fui arrasador.
- Aonde você trabalhava antes?
- Na Blockbuster.
- Você gostava?
- Nada acontecia de repente. Chegou um dia que achei que iria explodir.
- Eu sei como é que é.
- Não, não sabe.
- Sei sim. Pedi demissão do salão que eu trabalhava certa vez. Pedi por carta. Nem fui lá olhar a cara da madama. Ela disse que eu era chata! Você me acha uma chata?
- Não.
- Então diz.
- Já disse.
- Mas diz de novo.
- Não.
- Não pro quê? Preu ser chata ou pra dizer de novo.
- Querida, quer saber? Vou te dizer tudo nesta carta!
- Posso abrir agora?
- Não, espera eu chegar na esquina.

26 maio 2006

Ps em Sp

Sacal aqui é ter que explicar o óbvio e auto-explicativo, como "piá de prédio".

24 maio 2006

Mot de passe

Enquanto você discorria sobre a eficiência do guitarrista do Tears for Fears em Everybody wants to rule the world eu andava pelas ruas the São Paulo ao som de Lucky Man. Hapiness more or less... Felicidade marromeno é como água morna, intragável. Os extremos se suporta, mas a meia bomba é deflagrante. Os passos rápidos com as mãos no bolso escondiam sérios pensamentos sobre casa, comida e roupa lavada. De tudo que eu achava que iria ser aos vinte e cinco quando tinha quinze, o que mais dói é não ter dominado o mundo.

22 maio 2006

Frases furtadas

- Seu silêncio não é o que me aflige, é o que me cala.
- Nas tardes de sábado, eu chorava quando você não vinha.
- Pois é, amanhã de repente.
- Imagina se não. Eu liguei sim!
- A festa era mais tarde. Mas eu vou chegar às onze.
- Não sei porque deu ocupado. Não tinha ninguém em casa.
- É na quarta estação depois da central.
- Esse aqui pára no Paraíso?

18 maio 2006

Past tell the Paul me too

Era uma alpinista social, que acabou colunista social. Seu nome era Thelma Milattes (os dois t's são numerologia). Seu programa pretensiosamente se chamava Tell me. Era peituda e ia atrás da notícia. Certa vez, entrevistando um global que acabara de descer do avião, Thelminha foi logo enfiando o microfone na cara do cara, e perguntando: Então, me diga, o que você está achando aqui da nossa terra? O ator pacientemente debochado, escancarou: Olha, a visão do aeroporto é fantástica!

17 maio 2006

Estação da Luz

São Paulo sitiada.

14 maio 2006

Títulos

Não era erudito, era sacana. Ao explicar porque só escrevia em copta e esperanto, erguia as sombrancelhas, olhava de esgueio, e fazia ares de superior: "Meu texto é para poucos".

13 maio 2006

Sans foi, ni loi, ni roi

Em defesa da sociedade brisei em inverter paradigmas. Pensar o capitalismo por seus extremos. Dentre todas as interpretações fúteis dadas para A arte da Guerra (a pior versão é a para executivos; Ainda esperam suas versões os micro-empresários e os ambulantes), uma frase me chamou a atenção: "Se houve perdedores, a vitória não foi completa". O sr. Tzu, estratega de guerra de uma China duns três mil anos atrás, me incomodou muito tempo com sua frase. A associação do capitalismo com a guerra, neste caso, é menos direta do que parece. Naquela época a guerra tinha lugar e hora para acontecer, e os intervalos eram respeitados. Era uma guerra ética. Limpa. Não arrisco o pacífica, mas fico tentado. Três mil anos depois (a data é chutada), pensei no neoliberalismo americano. A capacidade dos peregrinos de sintetizar é prosaica, só comparável a habilidade da filosofia oriental de resumir grandes questões em metáforas. O neoliberalismo americano pode ser interpretado em sua lógica do one must fall. A frase inteira, no original, prevê que: "It is not enough to win, one must fall." Ou seja, sua derrota é a minha vitória, e esta não seria completa sem uma derrota. Já tentei, mas não dá para considerar Tzu um socilista. Nem a China. Os tigres rugem. Amarelos disfarçados de vermelhos não amarelam. Os peregrinos perseveram. Já não há mais intervalos respeitáveis. A grande guerra se anuncia. Não haverá equador para dividir seus pecados. Seguiremos todos. Sem fé, nem lei, nem rei.

04 maio 2006

Vidente faz amarração para o amor. Sigilo total.

- Alô? É da vidente?
- Sim. Aqui quem fala é a Vera. Como é o seu nome?
- Carlos.
- Homem ou mulher?
- Como assim, eu disse que meu nome é Carlos! Não está ouvindo minha voz? Você está me tirando?
- Não senhor. Por favor se acalme. Eu quis perguntar se a amarração é pra homem ou para mulher. É que hoje em dia metade dos trabalhos são feitos para o mesmo sexo.
- Ah bom. É para mulher... Mas, enfim, o trabalho é garantido? Se não der certo eu pego meu dinheiro de volta?
- Sempre dá certo. Eu nunca tive que devolver o dinheiro de um cliente.
- Tá certo então.
- Vou precisar do nome da moça e de um pedaço da roupa dela.
- Não vai dar. Ela mora em outra cidade. E eu nem a conheço assim, pessoalmente.
- Aí fica mais difícil.
- Se fosse fácil eu não estava te ligando!
- Claro senhor Carlos. Sem problemas. Fazemos muitos serviços assim. Como é o nome dela? Em qual cidade ela mora?
- Marisa Inácio da Silva. Brasília.
- Você tá falando da primeira dama?
- Sim. Sinto que somos almas gêmeas. Acho que ela tem tudo a ver comigo.
- Você está falando sério?
- Não, estou pagando o interurbano de idiota! Claro que eu estou falando sério!
- Mas isso é impossível!
- Se fosse fácil eu não estava te ligando, né? Porra, qualé, você é vidente e faz amarração, ou é propaganda enganosa? Olha que eu ligo no Procon, hein?
- Olha Sr. Carlos, já fiz muito trabalho difícil. Já apaixonei corinthiano e palmeirense, argentino e brasileira, e até marido com 30 anos de casado! Já consegui filha de ex-ministro, filho de desembargador. Mas no presidente eu não consigo chegar! O sr. sabe como é né, num país presidêncialista como o nosso, com concentração de poder no executivo e tal, eu te digo: Essa está fora do meu alcance! Sinto muito mas não posso lhe ajudar. Eu sou vidente, e não milagreira! Se o senhor quiser posso indicar um amigo meu que é ideal para o seu caso. Ele se chama Expedito, e ...
- Opa, opa! Sem ironia! Minha paixão já me maltrata bastante.
- Imagino... Olha sr. Carlos, infelizmente neste caso eu não posso ajudar. Não teria outra pessoa pela qual o sr. gostaria de se apaixonar.
- Bom... Deixa eu pensar... Tem uma que eu tenho uma quedinha... Não poderia chamar assim de paixão, mas acho que dava pro gasto.
- Ok. Vamos lá então: preciso do nome completo e de um pedaço da roupa.
- Ih, também não vai dar! Ela também mora em outra cidade.
- O senhor não consegue se apaixonar por ninguém de perto? O sr. tem alguma coisa contra as mulheres da sua cidade?
- Bom, na verdade eu sempre me senti um pouco frustrado sabe. Acho quem tem a ver com uma mãe castradora e ... Ei, espere aí! Você é vidente ou psicóloga?
- Desculpe senhor, eu não quis me intrometer. Então vamos lá: nome completo e cidade onde ela mora.
- Marisa Tomei. Califórnia.

02 maio 2006

Going out of my head

Eu sei, o mundo é mais maquiavélico do que pensamos. Ninguém escreve mais nada ao som de nada, o que muda tudo. Não importa, o sonho já tinha morrido bem antes daquele dia. Hojé é espectro. Estamos ficando velhos enquanto voltamos a viver como há dez anos atrás. Nossas referências são antigas, nossas garotas pós-modernas. Estou escrevendo para você, mas no fundo não faço deferência nenhuma mesmo. Nem ligo. Também não me ligam, não me lêem, não me adicionam nem me deixam scraps. Ser mito é estar fora de alcance. Caso contrário, seriam apenas cavalos com chifres. Você pode dizer que não viu, que pouco importa se a gente se lembra do Wes, em meio a uma noite cover no Korova. Nunca soubemos onde existe um cemitério de automóveis, muito menos sabemos dançar. Neonostálgicos de qualquer coisa, nunca nos poupamos deste carrasco ingrato que é o destino. Nem ele nos poupou. Pouco importa agora. Aqui jaz o som. Acabam-se as velas. Você insiste em insistir na teoria de que as pessoas fumam por solidão. Eu que não fumo e acabei com sua carteira. Vai saber. Na dúvida, prefiro companhia. Nem que seja a minha, em último caso. Há claro o infortúnio de ser previsível. Mas confesso ainda réu: sem passado, presente ou futuro, eu sou. Fragmentos. Sem explicação.

01 maio 2006

Fashionably late

Eram colecionadores de discos antigos. Sabiam tudo sobre música. Uma noite os encontrei no bar. Eles saindo, eu chegando. Disseram: Estamos indo para a casa do João. Hoje vamos ouvir várias novidades de 72!