13 janeiro 2010

RE: Carta a um companheiro de batalha

Amigo,

Comecemos sim um movimento, mas primeiro combatamos pela elegância. Esta, de tão esquecida e em desuso, serve mais como mote do que nossos velhos paz no mundo e alegria para todos. Desculpe a resposta demorada, estive entretido com meu ser pouco prolífico. Acrescentei a maldade ao seu lema, que pendurei em minha porta, em letras reluzentes: "O mundo é dos espertos e maldosos. Eles que se virem". E não tirei até agora. Também não atendi mais a campainha.

Perceba a ironia: o que nos aproxima é a distância. Distância entre o que buscamos e o que achamos. A volta para os seus, na Província, "para ver menor", não o livrou da solidão, tampouco me livrei dela vindo para a Cidade. Parafraseando Sartre, nunca fomos tão livres quanto no meio termo. Mas ainda buscamos os extremos. Ironia segunda: pela enésima vez tomo uma cerveja e deságuo frustrações usando-te de anteparo. Não sei se seríamos menos sós a dois, mas confesso sentir falta, vez por outra, de seu ouvido silencioso. O tradicional cigarro me acompanha, mas não há sacadas etílicas, apenas uma área de serviço onde, ainda, posso fumar em minha própria casa. Já não vejo mais rostos em prédios, e lamento às musas por não conseguir mais me apaixonar.

Saturno ameaça voltar, mas não sei não, desconfio que ele também vai me abandonar. Pior que mendigo sem cachorro, ando sem ideias, sem vontade de brigar que não para me defender. Se você é confundido com Cristo, pelos cabelos e barba, estou mais para Judas, mas sou malhado não sei porquê. Nada vendi, nada ganhei, a não ser a certeza que saí perdendo. Ok, confesso, dá um certo sabor a batalha, exercitando tudo no auge do vigor físico. Mas isso passa rápido, e depois só sobra o tédio de ter que lutar novamente.

Então, algo maior. Também anseio. Mas não lancemos um manifesto, que algum filho da puta de quinta categoria vai clonar e chamar de seu. Comecemos menores. Sugiro a elegância, algo que anda em falta. O Monge certa vez explicou que a estética é a filosofia do agora, porque seu fim é o espetáculo, irrepetível. Combatamos, pois, pela elegância agora, e um troquinho de irreverência para depois, porque ninguém é de ferro. Sipá com uma pitada de arte, mas não muito, para não estragar.

Pode ser?

Abraços

16 Comments:

Blogger Mariana said...

Tão bom que, depois de um longo e tenebroso inverno, ganharás um e-mail meu. rsrsrsrsrs

11:10 AM  
Blogger Ivy Farias said...

If after this, this, this... masterpiece, you complain about anything in your life, just shup up and think about all the lonely people that cannot write a single word without asking somebody.

8:53 PM  
Blogger Felipe said...

Amem!

4:37 PM  
Blogger Roger Dörl said...

decidi começar treinando a irreverência, que elegante eu sempre fui. rá!

só não ando mais muito silencioso, e realmente parei de fumar.

alguma coisa tinha que mudar, afinal.

4:26 AM  
Blogger Vizionario said...

Caros, a pedidos, explico:

A carta é uma resposta a http://mapadagua.blogspot.com/2009/04/carta-um-companheiro-de-batalha.html

do amigo cartógrafo.

3:52 PM  
Blogger Denise Sammarone said...

A presença de Saturno só está despontando... A parte boa, é que lá pelos 31 tudo passa a ter outro sentido... E muito melhor. Eu garanto. Baci, amore.

5:40 PM  
Anonymous Anônimo said...

Saturno só vai te abandonar para dar espaço para outro planeta.. J'espère.

7:15 PM  
Blogger Mariana Sanchez said...

Como sempre, sou a última a saber. Só agora li a repercussão da "Arte Emergencial" no novo endereço do Roger. Mas, sem demora, escrevi minhas impressões no velho Caos Portátil - de um encontro que, juro por deus, aconteceu recentemente.
Abraços (e feliz aniversário, porque você sabe que eu nunca esqueço) ;D

9:03 PM  
Anonymous Anônimo said...

Prezado Amigo Capitalista:

Li sua carta endereçada a seu outro amigo
Fiquei invejoso e redijo essas linhas de conforto para celebrar o seu aniversário:

Curiosa essa coisa chamada tempo ...
Alguns anos atrás, tempo era o mesmo que infinito

Inquebrantável
fosse
o corpo

Repousávamos na eternidade
Licenciávamo-nos sonhos de revolução

porque o tempo

Podia nos esperar.

Éramos Cronos, Senhores de um constante amanhecer

Hoje, veja como o tempo é arredio: Traiu-nos. Perverso, prometeu-nos o eterno quando, após o piscar dos anos, o ontem é passado pelo hoje que trará amanhã.

Então, despertados somos! Paramos de fumar, bebemos moderadamente, casamos, as madrugadas se tornam curtas e as noites, antes amarelas, ficam escuras e iluminadas por lâmpadas amarelas.

Mudamos para que o tempo pare.

Ah, mas ele não para. O tempo não para, não, não para. O poeta sabe

Quando jovens, verdadeiramente jovens – daqueles que sonham – bebíamos, fumávamos, éramos promíscuos em madrugadas dispersas em noites amarelas porque o tempo era nosso confidente. Confidente de sonhador é ouvido que não cansa, que não se entrega à matéria, ao pão. Confidente de sonhador respira o éter dos heróis. Éramos heróis de filmes de guerra e de canções de amor!

Mas, traímos o tempo. Não foi ele que nos traiu. Nós o ceifamos às costas! Desacreditamos nossas secretas confissões, nossos sonhos, nossa revolução e cremos no pão, no chão. E o tempo, meu amigo, o tempo, com amor de revolucionário, não perdoa: nos faz depender do chão, do pão, da matéria, todas essas coisas consideradas supérfluas pelos bem-aventurados que têm o tempo como confidente sonhador!

Atiramo-nos ao chão, comemos o pão e compramos a matéria: tudo isso para ter em mãos, novamente, o tempo! Em busca do tempo perdido ...

Não adianta, o tempo foi ser confidente dos que são jovens, dos que acreditam na única realidade: o sonho

A nós, resta-nos o castigo de Sísifo: a busca pela juventude perdida em meio à matéria vetusta!



ÁlvaroSantos

1:22 AM  
Anonymous Lady in Red said...

Já tá na hora de um post novo, não?

Beijos!

10:07 PM  
Anonymous Anônimo said...

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Anonymous Anônimo said...

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