19 maio 2020

Oliveira

Para mim ele virou um abacate. Ela tinha uns oito anos quando seu projeto de Ciências literalmente brotou sobre o algodão molhado. Cresceu os centímetros possíveis dentro do copinho. Uma tarde ele resolveu plantar aquela maravilha do engenho infantil na lateral da casa, acompanhado do olhar atento de sua cientista. Não evocou seu passado campestre, sua infância na roça, ou seus vastos conhecimentos botânicos inauditos. Ali foi apenas o assistente e torcedor de um projeto maior. Cercou com cuidado o broto na terra. E para o alto foi, passando o muro lateral. Diariamente em sua mesa no café da manhã ele contemplava a obra de sua assistência, agora já um tanto longínqua. Disseram que carregou de frutas na última primavera. Quando eu cheguei havia apenas um abacate faceiro, galhardo, de frente para a mesa da cozinha. Resistia, solitário. Enquanto abacate houvesse, história haveria. Ele morreu com três respiros curtos, e toda a ciência presente nada pode fazer. Fui embora, abacate ainda havia. Nem sei o que foi feito dele. Não sei se quero saber.